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Chiado: Sabores de lá, cá

comida

27 Nov

Em jeito de festejo pela atribuição de mais uma estrela Michelin ao Alma, de Henrique Sá Pessoa, fiz uma reserva no seu mais recente restaurante fora das fronteiras nacionais, o Chiado. Até à última sexta-feira não tinha provado nada da assinatura do chefe português e não sei se terei feito bem em fazê-lo fora do território nacional. Explico porquê.

Embora os países estejam cada vez mais globalizados, tornou-se habitual percorrer uma rua em Lisboa e ver um restaurante italiano, um chinês, um japonês, um argentino, um tailandês e por ai fora. O que nos separa de uma nova gastronomia são poucos metros.

Como apreciadora de comida foram várias as vezes que experimentei gastronomia asiática em Portugal (e na Europa). Quando cheguei à Ásia considerava-me conhecedora dos sabores locais. Falhei. Macau conquistou-me pelo estômago. A comida macaense que outrora experimentei em nada se parecia com a que confeccionam aqui. A tailandesa? Idem aspas. Nem sequer vamos falar da japonesa. Se existe diferença de um restaurante japonês de Macau para o Japão, imaginem de Portugal ou restante Europa. Não há nada como os sabores locais. Por muito que se tentem imitar ou criar. Os sabores são diferentes e os públicos também.

O outro lado da moeda

Já ouvi várias vezes, das visitas que recebo, “só não gosto de comida vietnamita”. Em reacção, costumo esboçar um sorriso e dizer, “ok, então comida vietnamita será”. Os sabores não se comparam, porque os produtos nascem em sítios diferentes, conjugam-se de diferentes formas e falam outra língua. Também aconteceu comigo. Experimentei insistentemente a chamada “comida chinesa” em Portugal. Aveiro, Lisboa, Coimbra e até Leiria. Vários sítios, diferentes restaurantes. O resultado foi sempre o mesmo: não gostava. Posso garantir-vos que alguns anos depois sei que não existe “comida chinesa”, existe sim, uma lista enorme de tipos de comidas de diferentes zonas da China, que o arroz “chau chau” é uma invenção de Portugal e que são poucas as gastronomias que conseguem ultrapassar esta.

O mesmo aconteceu com a comida japonesa. Durante uma entrevista, depois de provar algumas peças confeccionadas pelo entrevistado, constatei o mesmo. O sushi era diferente. Amavelmente o chef esclareceu que: “tem de existir um trabalho de adaptação do tipo de prato à comunidade, haverá mais portugueses a gostar do sushi adaptado do que do original”. Referia-se ao chamado sushi de fusão. No Japão o sushi come-se simples, sem queijos frescos, fritos, ou morangos e pepitas de chocolate. É cru, simples, descomplicado e profundamente saboroso. É maravilhoso. No entanto, isto não quer dizer que em Portugal seja pior. Não é isso que vos escrevo. Mas é muito diferente.

Posto isto, uns meses depois de me ter mudado para a Ásia, bem ao jeito saudosista, quis deliciar-me com um bom prato português. Admitindo a minha falta de jeito para a cozinha e as minhas inúmeras tentativas frustradas, pesquisei pelo melhor restaurante português e lá fui eu. Terminei a noite tristíssima, quase ofendida pelo insulto à gastronomia portuguesa. O caldo verde tinha um sabor que nunca senti na vida. A posta de bacalhau pedia-me perdão a cada garfada e nem os brócolos sabiam ao mesmo. Com a maior lata do mundo ainda roubei um pedaço de polvo à lagareiro do prato vizinho. Desilusão completa. Achei que me tinha enganado no melhor restaurante, portanto apostei numa segunda, terceira e quarta tentativa. Acabei por me habituar.

Bacalhau à Brás com gema de ovo a baixa temperatura e puré de cebola

Luz ao fundo do túnel

O Chiado está realmente muito perto dos sabores de casa, mas ainda não é casa. Nem lhe é exigido que o seja. O bacalhau não é tão forte como a posta gorda servida em Portugal e o leitão embora engane a saudade, faz-nos prometer uma visita à Bairrada.

O rei da noite é o lombo de borrego. Corte perfeito, textura macia, sabor suave e servido à temperatura ideal. Ao lado umas fabulosas migas de espargos com creme de alho, tomate assado e molho de amêijoas. Combinação perfeita.

Apesar de ter ficado completamente rendida ao lombo, o destaque vai para o pão, a pasta de azeitonas e a deliciosa manteiga, servidos como entradas. Não é fácil fazer um pão que à primeira dentada nos faça viajar no tempo, nos faça sentir o cheiro a torradas pela manhã enquanto ouvimos a mãe ou o avô a chamar-nos. Um pão que nos volte a sentar numa mesa rodeada de amigos a lutar pelo mergulho no azeite ou no molho da perfeita caldeirada. Não é fácil servir um pão em Macau que a cada migalha transpire a Portugal, às padarias, ao seu pão com tudo ou sem nada. Ninguém reconhece a importância de um bom pão como o emigrante.

E assim, o Chiado que tão longe está, serve-nos um bocadinho de todos nós, das nossas histórias, da nossa infância, da nossa família, dos nossos amigos. Num abrir e fechar de olhos.

Lombo de borrego com migas de espargos, creme de alho, tomate assado e molho de amêijoas

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Não sei se o azul combina com o vermelho ou se este ano os corsários estão na moda. Não decoro nomes, mas memorizo caras. Embora depois confunda tudo…

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𝙵𝙰𝚁 ✨
[✨ Não é preciso muito, quando se ama tanto. [✨ Não é preciso muito, quando se ama tanto.

Se lhe perguntassem qual era o ingrediente secreto para a felicidade ela soltava a resposta como flecha certeira: é amar. 

Não é o amor. É amar. Que interessa um par de pesos de amor a alguém que não sabe amar? 

Mas o segredo está, dizia ela, em saber amar as coisas pequenas. Amar a vida, mas principalmente as suas partículas minúsculas ! 

A brisa. O sol. E os raios. A chuva e as gotas. As flores. A relva a tocar no pé. O sabor dos alimentos que nascem da terra. A combinação da bateria, do piano, da guitarra. A melodia.  O som das palavras do outro quando nos fala das dores, das conquistas, da lista do supermercado. A gargalhada. E as gargalhadas. Daquele que passa na rua. Do que se senta na mesma mesa. Do que nos abraça. O bater do coração quando fechamos os olhos. Amar o dedo do pé até à ponta do nariz. A pestana, o dente torto, as calças apertadas. Amar. Os pensamentos positivos. Os dias tortos e as ruas direitas. 

Mas, avisou, é preciso saber Amar.  Não se ama porque se quer. Não se ama só dizendo que se ama. Não é fácil amar. Aí não é, não! 

Amar aquilo que nascemos a amar é fácil. Mas isso não é amar. É preciso amar por completo, e isso sim, disse ela, é difícil. 

Porque amar por inteiro implica treino, muita insistência, paciência e resiliência. Obriga-nos aos dias maus. Aos pensamentos destrutivos. Aos ataques de pânico. Para relembramos que a decisão está na palma das nossas mãos. Para nos voltar a colocar ao leme. Ao leme das nossas próprias vidas. 

Amar. Amar o dia seguinte, aquele em que nos levantamos, a medo, mas vamos. Aos tropeções, até voltar ao caminhar seguro. 

Bem, isso sim é saber amar! 

E quando soubermos amar tanto perceberemos que nunca foi preciso muito. Sempre esteve ali, bem guardado dentro de nós. 

A decisão de ser. De ir e fazer. De contrariar. De amar. 

De saber amar. ✨]
[ ✨ Às vezes tendo a exagerar. Gosto de sentir [ ✨ Às vezes tendo a exagerar. Gosto de sentir emoções e tropeço-me entre sentir em cheio ou não sentir. A apatia sempre me aterrorizou. É quando estou lá que tenho a ideia clara e firme de tudo aquilo que não quero sentir. O vazio. 

Seria muito ingrato da minha parte não vos dizer que esta experiência tem sido muito mais enriquecedora do que difícil. De facto, foram muito poucos os momentos que senti dificuldade, tendo até de me esforçar para os lembrar. E só me ocorre um. 

Seria também muito errado dizer-vos que este processo não me acrescentou. Acrescentou muito, mas por ser tão pessoal, tão íntimo, tão meu para mim, é-me impossível explicar-vos. Conseguir sequer escrever sobre isso. 

Vão dizer que outros que por aqui já passaram não sentiram o mesmo. É certo. Vão dizer que foi super fácil. Também certo. Vão dizer que foi um esforço terrível. Certíssimo. A viagem de cada um é exactamente isso, de cada um. 

Da minha parte foi uma decisão consciente. Agarrar em 21 dias em branco e mergulhar em leituras que me fizessem reflectir. Em histórias que me dissessem tudo. Em pessoas que me fizessem vibrar. Em decisões. Das mais sérias às mais vulgares. Decidi colocar tudo aquilo que a vida me permite,  em ordem. Num lugar organizado dentro de mim, da minha cabeça, da minha alma. Tudo o resto, deixei que fossem outros a tratar, que fosse a vida a decidir. 

Neste quarto entraram mil e umas quantas histórias. Nomes, pessoas, risadas e muita, tanta, partilha. A minha agenda chega ao fim destes 21 dias toda rabiscada, entre reuniões via zoom, gravações de conversas e planos, tantos planos para o momento seguinte. O futuro é visto assim, no segundo seguinte. Só esse. 

Já sinto o cheiro da meta. Já consigo visualizar-me a sair, já me coloco no regresso ao trabalho, à secretária e à minha equipa que todos os dias esteve aqui comigo. Já me sinto lá fora, num campo de ténis, num almoço entre amigos e numa passagem de ano fora de horas. 

(Continua 👇🏻 )
[ NOVO EPISÓDIO DO NOSSO LINDO E INSPIRADOR PODCA [ NOVO EPISÓDIO DO NOSSO LINDO E INSPIRADOR PODCAST 

Hoje trago-vos a @psicologa.deborabentocorreia, numa conversa cheia de carinho e sorrisos, sobre confinamento, saúde mental, rotinas e organização. Eu deixei que o meu quarto de clausura se inundasse no brilho do sorriso da Débora, ela, na sua voz doce e cheia de conteúdo, partilhou comigo os melhores comportamentos a assumir perante esta nova realidade. 

Falamos sobre cuidado, cuidar de nós e do outro. De amor próprio. Com desafios à mistura. 

Neste segundo round de confinamento, comecem em grande e em boa companhia.

Ouçam, ouçam. Enquanto cozinham, descansam, exercitam ou tomam banho. O que quiserem. Mas ouçam. Que consigamos todos aprender muito e ser ainda mais. 

✨ 

LINK NA BIO PARA AS DIFERENTES PLATAFORMAS 🎙🤍 ]
[ ✨ Continuo impressionada com a secura da minha [ ✨ Continuo impressionada com a secura da minha pele. Não que me incomode, é um facto, não incomoda. A não ser o nariz. Sinto o desconforto, borrifo água termal quando me lembro e se me dedico muito a senti-lhe a dor, fico chateada com o mundo. 

A verdade é que começo a apresentar sinais de frustração, ainda não percebi bem porquê, mas talvez seja esta recta final, o “está quase” que a minha mente insiste em dizer assim que acordo. 

Ao longo dos últimos dias, vocês, desse lado, questionaram-me muito sobre o número de dias de quarentena. Cheguei mesmo, no início, a escrever sobre isso, explicando que o Governo de Macau assim o decidiu devido, segundo os jornais locais, ao aparecimento da nova estirpe no Reino Unido. 

Lembro-me do dia do anúncio, estava em Portugal, a dois dias de me meter dentro de um avião rumo a Macau, e começaram a pipocar imensas mensagens no meu telemóvel. Eram os meus amigos de cá. “Pipinhas, 21 dias”, “Filipa, estás a ver a conferência?”, “Pipinhas vão aumentar a quarentena”, foram algumas das mensagens que recebi. 

O meu coração disparou, comecei a transpirar das mãos e acreditem, acreditem mesmo, quando vos escrevo que fui invadida por uma raiva que poucas vezes senti. 

Senti raiva de tudo. Da porcaria da pandemia. Do vírus. Dos meses intermináveis de limites, confinamentos, notícias, teorias da conspiração, exageros e desleixo. Depois de descarregar a minha raiva, sentei-me no sofá, abracei quem me acolheu e disse “só estou cansada, mas também quem já fez 14 dias uma vez, faz 21 na boa, né?!”.

Não. Vinte e um dias fechada num quarto de hotel é realmente demasiado tempo. Não é óptimo para descansar. Não é um retiro. Não são férias. É estar trancado num quarto, sem poder abrir a janela, sem ter autorização para colocar um pé no corredor e são quatro – QUATRO – zaragatoas nas narinas. Nunca pensei dizer isto, mas acho que enjoei a frango grelhado.

A determinada altura começamos a questionar se um esforço mental tão grande vale realmente a pena. Entramos numa linha entre não saber se queremos ir lá para fora ou ficar aqui para sempre.

(Continua 👇🏻)
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