FAR

  • sobre
  • viagens
  • comida
  • amor
  • contactos

Da janela do meu quarto 10/21

Da janela do meu quarto· destaque· Quarentena

6 Jan


Sempre fui pessoa de pessoas. Costumo dizer que adoro pessoas, mesmo aquelas de quem não gosto. Desligar-me delas é muito difícil. Custa-me horrores. Irónico para quem emigrou há quase uma década. Para quem nunca está quieta no mesmo sítio e sonha viver a sua vida de malas às costas e filhos pendurados nos braços. Aqui me confesso, sou nómada. Em lugares, nunca em corações. 

Posto isto, admito que o Rajesh me faz falta. (Para quem não está a perceber convido-vos a visitar as primeiras crónicas desta aventura.) 

Talvez seja birra, mas gostava de saber que aquela pessoa simpática estava do outro lado da porta. Dei várias vezes por mim, sentada no chão, junto à porta – local onde o Wi-Fi é mais forte – a espreitar para o fundo do corredor. Levantava o braço e recebia um aceno fervoroso de volta. Simples e divertido. Como deve ser a vida. 

Determinada a contornar a situação, hoje, quis dedicar-me mais tempo a conhecer o substituto do Rajesh. Seu compatriota, está cá para ficar. É tímido mas muito educado. Disse-me que já sabia que o quarto 708 recebia muitos presentes e que o meu saco da comida era mais leve do que todos os outros. 

Ri-me em jeito de concordância. Fechei a porta por saber que as ordens são claras, não pode haver muito tempo na comunicação. E fiquei-me por ali, a pensar sobre o tempo. 

Não é irónico que este excesso de tempo me faça sentir que não temos tempo? Eu sei, parece confuso. Mas ter tanto tempo em quatro paredes, mesmo ocupando-me com tudo aquilo que eu sempre disse querer fazer, ler, ler, ler, escrever, escrever, escrever, faz-me sentir que o tempo nos escapa, nos foge entre os dedos. Que nem lhe percebemos o voo. O instante.

Faz-me sentir que vivemos à pressa, entre malabarismos, agendas ocupadas e outros esforços. É o trabalho, o chefe e a equipa, são os miúdos, o trânsito e as consultas. É o evento neste dia, a aula no outro. São as refeições, o desporto e outras coisas mais. 

Desaprendemos a abrandar. Vivemos sem tempo. Corridos. Raramente paramos. Falta-nos espaço para sentir e ser. Tempo para sermos vistos. Tempo para ouvirmos. Tempo em nós e no outro. Sem pressa. Sem correrias. Sem relógios tatuados nos pulsos e ritmos cardíacos acelerados. 

Lembrei-me do meu avô, do tempo que me faltou com ele. Não tivemos tempo. Escapou-me entre os braços de um abraço. Lembrei-me que um dia, antes de se preparar para a sua sesta das 18horas, me ensinou que a maior tristeza da vida de um Homem era perceber que já não lhe restava tempo. E só hoje, neste quarto, com tempo para sentir, lhe soube o sentido das palavras.

Leave a Comment

« Da janela do meu quarto 9/21
Da janela do meu quarto 11/21 »

Deixe uma resposta Cancelar resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Não sei se o azul combina com o vermelho ou se este ano os corsários estão na moda. Não decoro nomes, mas memorizo caras. Embora depois confunda tudo…

  • Facebook
  • Instagram
  • RSS

No Instagram

farblog.pt

𝙵𝙰𝚁 ✨
[✨ Não é preciso muito, quando se ama tanto. [✨ Não é preciso muito, quando se ama tanto.

Se lhe perguntassem qual era o ingrediente secreto para a felicidade ela soltava a resposta como flecha certeira: é amar. 

Não é o amor. É amar. Que interessa um par de pesos de amor a alguém que não sabe amar? 

Mas o segredo está, dizia ela, em saber amar as coisas pequenas. Amar a vida, mas principalmente as suas partículas minúsculas ! 

A brisa. O sol. E os raios. A chuva e as gotas. As flores. A relva a tocar no pé. O sabor dos alimentos que nascem da terra. A combinação da bateria, do piano, da guitarra. A melodia.  O som das palavras do outro quando nos fala das dores, das conquistas, da lista do supermercado. A gargalhada. E as gargalhadas. Daquele que passa na rua. Do que se senta na mesma mesa. Do que nos abraça. O bater do coração quando fechamos os olhos. Amar o dedo do pé até à ponta do nariz. A pestana, o dente torto, as calças apertadas. Amar. Os pensamentos positivos. Os dias tortos e as ruas direitas. 

Mas, avisou, é preciso saber Amar.  Não se ama porque se quer. Não se ama só dizendo que se ama. Não é fácil amar. Aí não é, não! 

Amar aquilo que nascemos a amar é fácil. Mas isso não é amar. É preciso amar por completo, e isso sim, disse ela, é difícil. 

Porque amar por inteiro implica treino, muita insistência, paciência e resiliência. Obriga-nos aos dias maus. Aos pensamentos destrutivos. Aos ataques de pânico. Para relembramos que a decisão está na palma das nossas mãos. Para nos voltar a colocar ao leme. Ao leme das nossas próprias vidas. 

Amar. Amar o dia seguinte, aquele em que nos levantamos, a medo, mas vamos. Aos tropeções, até voltar ao caminhar seguro. 

Bem, isso sim é saber amar! 

E quando soubermos amar tanto perceberemos que nunca foi preciso muito. Sempre esteve ali, bem guardado dentro de nós. 

A decisão de ser. De ir e fazer. De contrariar. De amar. 

De saber amar. ✨]
[ ✨ Às vezes tendo a exagerar. Gosto de sentir [ ✨ Às vezes tendo a exagerar. Gosto de sentir emoções e tropeço-me entre sentir em cheio ou não sentir. A apatia sempre me aterrorizou. É quando estou lá que tenho a ideia clara e firme de tudo aquilo que não quero sentir. O vazio. 

Seria muito ingrato da minha parte não vos dizer que esta experiência tem sido muito mais enriquecedora do que difícil. De facto, foram muito poucos os momentos que senti dificuldade, tendo até de me esforçar para os lembrar. E só me ocorre um. 

Seria também muito errado dizer-vos que este processo não me acrescentou. Acrescentou muito, mas por ser tão pessoal, tão íntimo, tão meu para mim, é-me impossível explicar-vos. Conseguir sequer escrever sobre isso. 

Vão dizer que outros que por aqui já passaram não sentiram o mesmo. É certo. Vão dizer que foi super fácil. Também certo. Vão dizer que foi um esforço terrível. Certíssimo. A viagem de cada um é exactamente isso, de cada um. 

Da minha parte foi uma decisão consciente. Agarrar em 21 dias em branco e mergulhar em leituras que me fizessem reflectir. Em histórias que me dissessem tudo. Em pessoas que me fizessem vibrar. Em decisões. Das mais sérias às mais vulgares. Decidi colocar tudo aquilo que a vida me permite,  em ordem. Num lugar organizado dentro de mim, da minha cabeça, da minha alma. Tudo o resto, deixei que fossem outros a tratar, que fosse a vida a decidir. 

Neste quarto entraram mil e umas quantas histórias. Nomes, pessoas, risadas e muita, tanta, partilha. A minha agenda chega ao fim destes 21 dias toda rabiscada, entre reuniões via zoom, gravações de conversas e planos, tantos planos para o momento seguinte. O futuro é visto assim, no segundo seguinte. Só esse. 

Já sinto o cheiro da meta. Já consigo visualizar-me a sair, já me coloco no regresso ao trabalho, à secretária e à minha equipa que todos os dias esteve aqui comigo. Já me sinto lá fora, num campo de ténis, num almoço entre amigos e numa passagem de ano fora de horas. 

(Continua 👇🏻 )
[ NOVO EPISÓDIO DO NOSSO LINDO E INSPIRADOR PODCA [ NOVO EPISÓDIO DO NOSSO LINDO E INSPIRADOR PODCAST 

Hoje trago-vos a @psicologa.deborabentocorreia, numa conversa cheia de carinho e sorrisos, sobre confinamento, saúde mental, rotinas e organização. Eu deixei que o meu quarto de clausura se inundasse no brilho do sorriso da Débora, ela, na sua voz doce e cheia de conteúdo, partilhou comigo os melhores comportamentos a assumir perante esta nova realidade. 

Falamos sobre cuidado, cuidar de nós e do outro. De amor próprio. Com desafios à mistura. 

Neste segundo round de confinamento, comecem em grande e em boa companhia.

Ouçam, ouçam. Enquanto cozinham, descansam, exercitam ou tomam banho. O que quiserem. Mas ouçam. Que consigamos todos aprender muito e ser ainda mais. 

✨ 

LINK NA BIO PARA AS DIFERENTES PLATAFORMAS 🎙🤍 ]
[ ✨ Continuo impressionada com a secura da minha [ ✨ Continuo impressionada com a secura da minha pele. Não que me incomode, é um facto, não incomoda. A não ser o nariz. Sinto o desconforto, borrifo água termal quando me lembro e se me dedico muito a senti-lhe a dor, fico chateada com o mundo. 

A verdade é que começo a apresentar sinais de frustração, ainda não percebi bem porquê, mas talvez seja esta recta final, o “está quase” que a minha mente insiste em dizer assim que acordo. 

Ao longo dos últimos dias, vocês, desse lado, questionaram-me muito sobre o número de dias de quarentena. Cheguei mesmo, no início, a escrever sobre isso, explicando que o Governo de Macau assim o decidiu devido, segundo os jornais locais, ao aparecimento da nova estirpe no Reino Unido. 

Lembro-me do dia do anúncio, estava em Portugal, a dois dias de me meter dentro de um avião rumo a Macau, e começaram a pipocar imensas mensagens no meu telemóvel. Eram os meus amigos de cá. “Pipinhas, 21 dias”, “Filipa, estás a ver a conferência?”, “Pipinhas vão aumentar a quarentena”, foram algumas das mensagens que recebi. 

O meu coração disparou, comecei a transpirar das mãos e acreditem, acreditem mesmo, quando vos escrevo que fui invadida por uma raiva que poucas vezes senti. 

Senti raiva de tudo. Da porcaria da pandemia. Do vírus. Dos meses intermináveis de limites, confinamentos, notícias, teorias da conspiração, exageros e desleixo. Depois de descarregar a minha raiva, sentei-me no sofá, abracei quem me acolheu e disse “só estou cansada, mas também quem já fez 14 dias uma vez, faz 21 na boa, né?!”.

Não. Vinte e um dias fechada num quarto de hotel é realmente demasiado tempo. Não é óptimo para descansar. Não é um retiro. Não são férias. É estar trancado num quarto, sem poder abrir a janela, sem ter autorização para colocar um pé no corredor e são quatro – QUATRO – zaragatoas nas narinas. Nunca pensei dizer isto, mas acho que enjoei a frango grelhado.

A determinada altura começamos a questionar se um esforço mental tão grande vale realmente a pena. Entramos numa linha entre não saber se queremos ir lá para fora ou ficar aqui para sempre.

(Continua 👇🏻)
Mostrar mais

seguir no Instagram

design by WE BLOG YOU