O corpo começa a dar sinais de que está há demasiado tempo fechado. Embora me mantenha activa, entre exercícios de yoga e alongamentos, a pele está seca. Sequíssima.
Estas bochechas gordas que me ocupam a cara gritam por misericórdia. Hoje, a rir-me numa das muitas chamadas de vídeo que mantenho por dia, rasguei um pedacinho de pele. Não há creme gordo, hiper hidratante ou litros de água bebidos que me safem. O corpo acusa a falta de ar natural e o excesso de ar condicionado que desde dia 27 de dezembro não tem descanso.
O estômago começa a enjoar. Já nem é da comida, é do processo para ter comida quente, do cheiro a arroz branco a entrar-me pelo quarto e os talheres lavados no lavatório.
Comentava hoje com uma amiga que na arte do desenrasque os portugueses são os melhores. É que vejamos, o meu lavatório serve para a sua função principal, claro, para lavar roupa, para lavar loiça e ainda para aquecer comida recorrendo a um improviso de banho maria. Nisto ninguém nos bate.
Também ninguém nos ultrapassa na simpatia. Foi isso mesmo que o Gan me disse hoje. Contava-me ele que mudou a hora de medir a temperatura porque a menina portuguesa do 708 estava de jet lag. Senti-me importante. Ele explicou que todos os portugueses que conheceu em Macau “são assim, super simpáticos e calorosos, tratando bem os outros”, insistindo “mesmo os que não conhecem”. Rematou de forma perfeita, “perguntam sempre se está tudo bem e se podem ajudar”.
Português que é português adora ouvir falar do seu povo. E, se houver espaço, carrega ainda mais. “Somos assim, Gan, muito trabalhadores e gostamos de aproveitar a vida, boa comida, bom tempo. Somos boas pessoas, gostamos de pessoas.”
Felizmente tive a sorte e privilégio de poder visitar alguns países. Em quase todos fui muito bem recebida, noutros nem tanto, faz parte da experiência. Mas quanto mais viajo melhor percebo que somos um povo bonito de se ver, mas principalmente de se conhecer.
O português é simpatico de essência. E a nossa simpatia e à vontade são coisas mui raras neste mundo maluco. Permitam-me a generosidade misturada com exagero, mas ninguém sabe receber como nós, de braços e peito aberto, como quem já convida para entrar em casa, sentar na mesa e, claro, comer e beber. Gostamos de partilhar e fazemos perguntas. Temos sede de saber. E de todos os sítios onde já fui, ninguém é tão disponível e esforçado quanto nós para ajudar alguém. Somos assim, simpáticos de nascença e prestáveis de coração.
Talvez seja a ironia da vida, quanto mais longe vou, mais rápido quero regressar.
Amei o texto