Não podia ser mais simbólico. E bonito. O meu companheiro da medição de temperatura, Rajesh (do que me foi possível perceber por detrás da máscara), natural da Índia, vai partir numa nova aventura. Hoje foi o seu último dia de trabalho. Segue-se uma outra experiência, também em Macau, mas bem diferente do ramo hoteleiro.
Rimos da simbologia do momento. No último dia do ano, ele despede-se de mim. Da beleza de fechar ciclos e começar novos, da carga positiva que terminar no fim e começar no início tem. Rimos mais. Ele estava muito entusiasmado e feliz. E isso bastou-me para que o lamento de perder o meu novo amigo se desvanecesse por completo.
Ontem lia um artigo da sexóloga Tânia Graça – se não conhecem, aconselho-vos muito, é que estamos todos cheios de muitos preconceitos e ideias primitivas. Desta vez a Tânia escrevia sobre amor verdadeiro, de como é fácil destruir um amor só porque ele terminou, só porque duas pessoas seguiram rumos diferentes, só por se terem incompatibilizado.
Durante a minha vida incompatibilizei-me com um saco cheio de gente. Nunca por culpa dessas pessoas. Há, de facto, pessoas de quem não gosto, mas quando me confronto, confronto sempre por mim. Porque em algum momento preciso de ser validada, de me sentir aceite. Porque em algum momento quero, exijo, que aquela pessoa corresponda às minhas expectativas, que ironicamente, são só minhas. Porque quero, a todo o momento, que aquela pessoa perceba, aceite e se comporte como eu idealizo, como eu acho que tem de ser. Como se a minha realidade fosse absoluta. Como se a minha verdade fosse universal. Como se a minha verdade fosse sequer verdade.
Este 2020 serviu-me para isso, saber que a luta pela razão é o esforço mais inglório das nossas vidas. Que a razão vale muito pouco, tem quase nada de amor, do que é verdade e de essência. Este ano que termina agora, ensinou-me que na escolha entre a razão e a paz, tentarei sempre escolher a paz. Por ser o caminho que eu conscientemente escolho. E não é fácil, nem sempre vou conseguir. Não é fácil sabermos os nossos defeitos, aceitá-los, reconhecê-los e modificá-los. Creio ser dos trabalhos mais difíceis de reforma pessoal.
Este ano que termina, serviu também para me ensinar que dure o tempo que durar, o amor não tem prazo. Não tem validade ou forma específica. Que quanto és para o outro és em amor, nada mais. Ensinou também que no amor não existem fronteiras, distâncias ou culpas.

Que este Rajesh é amor, por da forma mais bonita que soube, ter cuidado de mim, ter, com ou sem consciência, animado estes meus últimos cinco dias que me pareceram 7 meses.
Este 2020 trouxe-me esta concretização de que ninguém passa na tua vida em vão. Que trazem em si ensinamentos, novas portas, convites a reflexões. Que de alguma forma quem tem de estar, está, quem tem de ser em ti, será.
Que em algum momento estamos todos ligados. Nem que seja por um instante, tu és em mim, eu serei em ti. E não há maior beleza do que essa. Sermos, uns nos outros.
Obrigada 2020, custaste-nos, mas aqui estamos a brindar a ti e a receber o novo. Mais preparados que ontem, menos preparados que amanhã.
Feliz ano, pedacinhos.
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