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Da janela do meu quarto 9/21

Da janela do meu quarto· destaque· Quarentena

5 Jan

Está escolhida a palavra do ano de 2020. SAUDADE. Na eleição, conduzida pelo grupo Porto Editora, saudade foi a palavra mais votada pelos portugueses para representar o último ano. Não foram as óbvias “Covid-19”, “pandemia”, “confinamento” ou até “zaragatoa”. A escolher, os portugueses preferiram aquilo que mais sentiram. Saudade. 

Como devem compreender, graças à tecnologia, uma fatia generosa do meu tempo de confinamento é passado em contacto com o mundo lá fora. Não existem dados que aguentem, nem internet ilimitada que não termine. Hoje, numa dessas longas conversas de partilha, ouvia uma amiga que está “presa” em Macau há um ano. 

Se ontem vos mostrei um lado feliz de um grupo de medidas que nos protege a todos, hoje também vos venho dizer aquilo que todos sabemos. Não há vidas perfeitas. Opções correctas. Decisões maravilhosas. Em todo o lado bom existe o mau. Toda e qualquer causa tem um efeito. Bom e mau. Em todas as decisões existem boas e más consequências. A vida é esta balança. Esta tentativa de equilíbrio. Idealmente, de prejudicar o menos possível. 

Estar nesta bolha de protecção tem as suas desvantagens. Que agora, com o passar do tempo, com um fim que não se alcança a olho nú, começa a pesar. 

Há famílias separadas há meses. Há pais que nunca conheceram os filhos. Muitas vidas estão paradas. Os bolsos começam a esvaziar e as opções a escassear. Uns presos em fronteiras que não se abrem para todos. Outros por impossibilidade logística. Seja por trabalho, seja pelas medidas impostas. 

Há pessoas que se sentem esquecidas. Outras tantas que ao peito não carregam nada mais do que saudade. Bem sei que em Portugal é difícil, que não nos podemos tocar, que o abraço nos falta. O toque. O cheiro. Bem sei que olhar ao longe sabe a pouco, quando o que queremos é tanto. E não existe, nem pode existir, competição quando estamos todos a lutar. 

Por aqui vive-se lado a lado com a saudade. Ser emigrante é saber aceita-la no nosso dia-a-dia. É saber que ela veio para ficar. Do nosso peito não vai sair. 

Ser emigrante em tempos de pandemia é um esforço hercúleo. É obra prima do sacrifício. É doer cada pedaço de amor que sentimos pelo outro. Ser emigrante em tempos de pandemia, com portas fechadas, sonhos suspensos e abraços esquecidos, é aguentar até explodir. É não ver fim. É querer ir, sem poder mexer um pé. 

Cumpro 21 dias porque outras forças me obrigaram a ir a Portugal. Mas no intervalo dessas forças, vi o meu pai durante 15 minutos, olhei-o nos olhos e disse-lhe que estava bem. Certifiquei-me que ele também estava bem. Prometi-lhe, em pessoa, voltar, assim que puder. 

Vi a minha mãe. Abracei-a por dois dias depois de saber que estávamos as duas negativas. Vi a minha irmã, sem a abraçar, mas pisquei-lhe o olho, sorri-lhe, ofereci-lhe pedaços meus, como quem pede para não me esquecer. 

Ouvi quem amo, umas vezes de olhos em lágrimas e outras de sorriso rasgado. Prometi voltar. E sei que voltarei. Estive lá. Vi. E hoje a ouvir a minha amiga desejei que fosse ela, fosse ela a ver aqueles que ama, mesmo que fosse assim, de longe. 

Que lhe dessem esse resto de esperança, que lhe entregassem esse acreditar em forma de rostos, de cheiros e de abraços prometidos. Quis que aqueles que aqui estão, que nos parecem tantas vezes esquecidos por quem decide, pudessem sentir aquilo que eu senti, um bocadinho de menos saudade.  

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Não sei se o azul combina com o vermelho ou se este ano os corsários estão na moda. Não decoro nomes, mas memorizo caras. Embora depois confunda tudo…

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𝙵𝙰𝚁 ✨
[✨ Não é preciso muito, quando se ama tanto. [✨ Não é preciso muito, quando se ama tanto.

Se lhe perguntassem qual era o ingrediente secreto para a felicidade ela soltava a resposta como flecha certeira: é amar. 

Não é o amor. É amar. Que interessa um par de pesos de amor a alguém que não sabe amar? 

Mas o segredo está, dizia ela, em saber amar as coisas pequenas. Amar a vida, mas principalmente as suas partículas minúsculas ! 

A brisa. O sol. E os raios. A chuva e as gotas. As flores. A relva a tocar no pé. O sabor dos alimentos que nascem da terra. A combinação da bateria, do piano, da guitarra. A melodia.  O som das palavras do outro quando nos fala das dores, das conquistas, da lista do supermercado. A gargalhada. E as gargalhadas. Daquele que passa na rua. Do que se senta na mesma mesa. Do que nos abraça. O bater do coração quando fechamos os olhos. Amar o dedo do pé até à ponta do nariz. A pestana, o dente torto, as calças apertadas. Amar. Os pensamentos positivos. Os dias tortos e as ruas direitas. 

Mas, avisou, é preciso saber Amar.  Não se ama porque se quer. Não se ama só dizendo que se ama. Não é fácil amar. Aí não é, não! 

Amar aquilo que nascemos a amar é fácil. Mas isso não é amar. É preciso amar por completo, e isso sim, disse ela, é difícil. 

Porque amar por inteiro implica treino, muita insistência, paciência e resiliência. Obriga-nos aos dias maus. Aos pensamentos destrutivos. Aos ataques de pânico. Para relembramos que a decisão está na palma das nossas mãos. Para nos voltar a colocar ao leme. Ao leme das nossas próprias vidas. 

Amar. Amar o dia seguinte, aquele em que nos levantamos, a medo, mas vamos. Aos tropeções, até voltar ao caminhar seguro. 

Bem, isso sim é saber amar! 

E quando soubermos amar tanto perceberemos que nunca foi preciso muito. Sempre esteve ali, bem guardado dentro de nós. 

A decisão de ser. De ir e fazer. De contrariar. De amar. 

De saber amar. ✨]
[ ✨ Às vezes tendo a exagerar. Gosto de sentir [ ✨ Às vezes tendo a exagerar. Gosto de sentir emoções e tropeço-me entre sentir em cheio ou não sentir. A apatia sempre me aterrorizou. É quando estou lá que tenho a ideia clara e firme de tudo aquilo que não quero sentir. O vazio. 

Seria muito ingrato da minha parte não vos dizer que esta experiência tem sido muito mais enriquecedora do que difícil. De facto, foram muito poucos os momentos que senti dificuldade, tendo até de me esforçar para os lembrar. E só me ocorre um. 

Seria também muito errado dizer-vos que este processo não me acrescentou. Acrescentou muito, mas por ser tão pessoal, tão íntimo, tão meu para mim, é-me impossível explicar-vos. Conseguir sequer escrever sobre isso. 

Vão dizer que outros que por aqui já passaram não sentiram o mesmo. É certo. Vão dizer que foi super fácil. Também certo. Vão dizer que foi um esforço terrível. Certíssimo. A viagem de cada um é exactamente isso, de cada um. 

Da minha parte foi uma decisão consciente. Agarrar em 21 dias em branco e mergulhar em leituras que me fizessem reflectir. Em histórias que me dissessem tudo. Em pessoas que me fizessem vibrar. Em decisões. Das mais sérias às mais vulgares. Decidi colocar tudo aquilo que a vida me permite,  em ordem. Num lugar organizado dentro de mim, da minha cabeça, da minha alma. Tudo o resto, deixei que fossem outros a tratar, que fosse a vida a decidir. 

Neste quarto entraram mil e umas quantas histórias. Nomes, pessoas, risadas e muita, tanta, partilha. A minha agenda chega ao fim destes 21 dias toda rabiscada, entre reuniões via zoom, gravações de conversas e planos, tantos planos para o momento seguinte. O futuro é visto assim, no segundo seguinte. Só esse. 

Já sinto o cheiro da meta. Já consigo visualizar-me a sair, já me coloco no regresso ao trabalho, à secretária e à minha equipa que todos os dias esteve aqui comigo. Já me sinto lá fora, num campo de ténis, num almoço entre amigos e numa passagem de ano fora de horas. 

(Continua 👇🏻 )
[ NOVO EPISÓDIO DO NOSSO LINDO E INSPIRADOR PODCA [ NOVO EPISÓDIO DO NOSSO LINDO E INSPIRADOR PODCAST 

Hoje trago-vos a @psicologa.deborabentocorreia, numa conversa cheia de carinho e sorrisos, sobre confinamento, saúde mental, rotinas e organização. Eu deixei que o meu quarto de clausura se inundasse no brilho do sorriso da Débora, ela, na sua voz doce e cheia de conteúdo, partilhou comigo os melhores comportamentos a assumir perante esta nova realidade. 

Falamos sobre cuidado, cuidar de nós e do outro. De amor próprio. Com desafios à mistura. 

Neste segundo round de confinamento, comecem em grande e em boa companhia.

Ouçam, ouçam. Enquanto cozinham, descansam, exercitam ou tomam banho. O que quiserem. Mas ouçam. Que consigamos todos aprender muito e ser ainda mais. 

✨ 

LINK NA BIO PARA AS DIFERENTES PLATAFORMAS 🎙🤍 ]
[ ✨ Continuo impressionada com a secura da minha [ ✨ Continuo impressionada com a secura da minha pele. Não que me incomode, é um facto, não incomoda. A não ser o nariz. Sinto o desconforto, borrifo água termal quando me lembro e se me dedico muito a senti-lhe a dor, fico chateada com o mundo. 

A verdade é que começo a apresentar sinais de frustração, ainda não percebi bem porquê, mas talvez seja esta recta final, o “está quase” que a minha mente insiste em dizer assim que acordo. 

Ao longo dos últimos dias, vocês, desse lado, questionaram-me muito sobre o número de dias de quarentena. Cheguei mesmo, no início, a escrever sobre isso, explicando que o Governo de Macau assim o decidiu devido, segundo os jornais locais, ao aparecimento da nova estirpe no Reino Unido. 

Lembro-me do dia do anúncio, estava em Portugal, a dois dias de me meter dentro de um avião rumo a Macau, e começaram a pipocar imensas mensagens no meu telemóvel. Eram os meus amigos de cá. “Pipinhas, 21 dias”, “Filipa, estás a ver a conferência?”, “Pipinhas vão aumentar a quarentena”, foram algumas das mensagens que recebi. 

O meu coração disparou, comecei a transpirar das mãos e acreditem, acreditem mesmo, quando vos escrevo que fui invadida por uma raiva que poucas vezes senti. 

Senti raiva de tudo. Da porcaria da pandemia. Do vírus. Dos meses intermináveis de limites, confinamentos, notícias, teorias da conspiração, exageros e desleixo. Depois de descarregar a minha raiva, sentei-me no sofá, abracei quem me acolheu e disse “só estou cansada, mas também quem já fez 14 dias uma vez, faz 21 na boa, né?!”.

Não. Vinte e um dias fechada num quarto de hotel é realmente demasiado tempo. Não é óptimo para descansar. Não é um retiro. Não são férias. É estar trancado num quarto, sem poder abrir a janela, sem ter autorização para colocar um pé no corredor e são quatro – QUATRO – zaragatoas nas narinas. Nunca pensei dizer isto, mas acho que enjoei a frango grelhado.

A determinada altura começamos a questionar se um esforço mental tão grande vale realmente a pena. Entramos numa linha entre não saber se queremos ir lá para fora ou ficar aqui para sempre.

(Continua 👇🏻)
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