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DOS AMORES LÁ DE CASA (II)

amor· destaque

25 Set

O FAR tem andado um bocadinho desaparecido porque estamos em mudanças. Caixotes para um lado, móveis desmontados por outro, sacos e sacos de tralha acumulada nos últimos anos. Sem qualquer razão, mas que na altura fazia todo o sentido guardar.

Sempre me dei muito bem com a ideia de mudar de casa. Na verdade, era prática comum na minha família. Uma mão cheia de anos numa casa e lá estávamos nós a mudar. O processo desde o dia em que a minha mãe nos dizia, quando se referia a uma decisão já tomada entre ela e o meu padrasto, “acho que devíamos mudar de casa”, até à chegada à nova casa era um montão de adrenalina e felicidade no meu pequeno coração. Gosto de mudanças. Gosto da inquietude que antecede uma mudança. Aqueles receios, as certezas, o “mudar de página”, o mergulhar “numa nova fase”. Tenho títulos para tudo, dependendo da intensidade que lhe quero dar.

Foi, talvez por isso, muito estranho quando alguém na minha família decidiu que era altura para comprar uma casa. O conceito de comprar casa existia para as outras famílias. Todas as outras. Mas não a minha. Todos concordaram. Eu, depois de me explicarem, também. Mas não consegui disfarçar a desilusão. Comprar, poderia significar não voltar a mudar. Ficar ali para sempre. E estas asas atrofiadas não me permitem ficar muito tempo no mesmo lugar. Entro em pequenos sufocos mentais e emocionais. É quase patológico.

De cada casa guardo profundas e felizes recordações. Cada uma delas tem as suas próprias características, e gosto, quando posso, de voltar a passar por elas. A imaginar-lhes novas famílias ou a recordar outros tempos. Tempos em que eu era professora das minhas bonecas, ou adolescente que saltava pela janela, ou na casa que me prendeu durante horas no elevador. E os natais? As diferentes decorações, o jardim iluminado, ou as luzes à janela quando não havia jardim.

A cada casa atribuía um cheiro, um sabor, uma música. Tenho-as catalogadas na minha mente.

Depois de ganhar alguma idade, em quase todas elas dediquei-me muito a transformá-la num lar. Nem sempre foi possível. E ao longo do tempo, com gosto mais apurado e necessidades diferentes, fui criando requisitos obrigatórios. Luz natural, janelas, quantas mais melhor e chão de madeira.

Transformar uma casa num lar não é tarefa fácil. Lembro-me de um dia me dizerem: Um lar será sempre uma casa, mas uma casa nem sempre é um lar. Um lar tem como pilares o amor. O carinho de um porto-seguro. A protecção de uma família unida, sejam quantos forem. Dez, quatro ou um. É o nosso lugar. É ali que pertencemos. É ali que baixamos as guardas, abrimos portas à fragilidade, aos receios. É ali que recuperamos. Que recarregamos energias. É ali que escrevemos grande parte da nossa história.

Lembro-me de escrever cartas de despedida às minhas casas. Com o tempo perdi-as quase todas. Mas lembro-me de reler umas poucas e sentir uma espécie de nostalgia envergonhada. Mas recordo-as todas como a mais bela despedida, carregada de gratidão, que lhes podia entregar.

Hoje deixo aquela que, sem hesitação, foi, até ao momento, a casa mais importante na minha história. Recebeu-me adulta, transformou-me como mulher, como ser humano, como ser. Apenas. Ser. Foi tudo aquilo que sonhei que uma casa poderia ser. Porto de abrigo em todos os trambolhões, escola e sala de reflexão, foi confessionário de tanta gente. Gente que amo. Foi salão de festas.

Foi adolescente, casa de estudantes e casa de família. E foi aqui, pela primeira vez, que dei os primeiros passos para a mulher que quero ser. Foi aqui, na varanda, nos quartos, na nossa sala que aprendi sofrendo, aprendi rindo e, aqui, reforcei sempre a minha esperança.

Esta casa é mais importante do que qualquer outra por onde passei. Por ser a minha primeira casa. O meu primeiro lar, sem a proteção do abraço da mãe, do conforto da família que a tantos quilómetros de distância está. Foi ela, esta casa, que me fez sentir que pertencia a um lugar. A uma porta que se abria sempre que eu queria e só quando eu queria.

Foi também aqui que me tornei amor. Por todo aquele amor que entreguei aos que me visitaram. Aos que aqui estiveram. Por todo o amor que recebi. Da Leonor que me ajudou na construção, da Liane que deixou saudades escrito por todas as paredes, móveis e janelas e do Pedro que me agarrou a mão e me transformou para sempre.

E nessa caminhada, com esta casa como cenário, aprendemos a melhor lição de todas. Neste lugar mais seguro do mundo, saímos de corações apertadinhos, mas mais fortes, mais felizes e mais certos que a receita perfeita será sempre: amar.

A casa, o outro, a vida. Hoje, fechamos a porta para abrir outras tantas. E vamos cheios de gratidão. Porque sabemos que em qualquer parte, desde que haja amor, construiremos o nosso lar.

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Não sei se o azul combina com o vermelho ou se este ano os corsários estão na moda. Não decoro nomes, mas memorizo caras. Embora depois confunda tudo…

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[ ✨ Amar as perguntas. Amar as respostas. Amar a [ ✨ Amar as perguntas. Amar as respostas. Amar a vida. E a certeza de não sermos eternos. 

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Amar as experiências. Amar o ódio. Amar o hoje e o ontem. Amor o amor. Amar a possibilidade de amar. 

A resposta será sempre amor. Em todas as suas formas e feitios, cheiros e sabores. Em toda a sua essência. Amor e amar. ✨] 

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[ ✨ Continuo a impressionar-me com o ser humano. [ ✨ Continuo a impressionar-me com o ser humano. É uma máquina de surpresas e coisas inesperadas tantas vezes injustificáveis ao olhar dos mortais. Estou cada vez mais certa de que somos capazes de tudo, mesmo o que achamos ser impossível. 

Dizia-me um médico, que mais do que isso meu amigo é, que “está cientificamente provado que o impossível não existe”. Um bocadinho influenciada pela admiração que lhe sinto, amei a ideia. 

A experiência dos 21 dias continua muito presente no meu pensamento. Muitas vezes de forma involuntária e quase inconsciente. Não procuro pensar sobre o que foi, o que mudou, se é que mudou alguma coisa. Não procuro sequer atribuir-lhe um sentido, nem um valor que a sociedade diz que não deve ter. É o que é, para cada um de nós. 

No entanto não posso deixar de notar nesta capacidade que temos de tornar tudo muito “normal” quando passa a ser a nossa realidade. O ser humano é de hábitos e até a montanha mais difícil de escalar, nós, os humanos, desde que lá, a tornamos a nossa habitual e tranquila realidade. Somos elásticos e adaptamo-nos de forma impressionante. 

O isolamento tornou-se um hábito e, por isso, a minha realidade. No entanto, só o soube já “cá fora”, quando confrontada com o número de pessoas na rua, o barulho dos autocarros, a falta de tempo para mergulhar na minha própria rotina, suspensa algures no tempo. Uma exigência de todos e de mim mesma naquilo que seria o meu normal.

Desse lado muitos de vocês quiseram saber como foi regressar. “A que é que sabe a liberdade?”, alguém perguntou. 

A liberdade soube-me a azedo. Foi confusa, faltou-me tempo para respirar e dei por mim a roçar uma espécie de síndrome de Estocolmo com o isolamento. Foi confuso e o meu corpo fazia-o notar.

Acordava sem noções de que horas seriam, o apetite raramente existia e quando surgia tinha horas muito esquisitas para o fazer. 

Acordava às 3 da madrugada com fome e uma hora depois, mesmo de estômago cheio, estava esfomeada. 

Esquecia-me de tomar o pequeno-almoço e nunca me lembrei de jantar. Às 09 da manhã sentia-me cansada como se fossem 22horas e às 22h estava a dormir desde as 19h.

(Cont. 👇🏻)
[ Quando era mais nova gostava de me trancar na sa [ Quando era mais nova gostava de me trancar na sala. Colocava a música bem alta, afastava os sofás e criava a minha pista de dança. Aproveitava quando ninguém estava em casa. 

Ria. Ria muito com os meus passos de dança, com os pulos e dava por mim a gargalhar até cair no chão de exaustão.

Sem ouvir a porta de entrada a abrir, foram algumas as vezes que fui apanhada pela minha mãe que sorria perante o espetáculo. Quando eram os meus irmãos a apanhar-me, não me livrava de uma semana de chacota, risinhos e apontar de dedos. 

Nunca percebi porque é que a dança do outro era motivo de zombaria, mas percebi cedo que dançamos todos de formas muito diferentes.

Ontem, sozinha em casa, liguei o sistema de som mais alto do que o costume e senti-me a viajar no tempo. Lembrei-me aos pulos, de olhos fechados e a gargalhar com a música, com a dança. 

Voltei a mim e senti-me presa a um corpo cheio de pudor. Cheio de rótulos, ideias sociais e definições de ridículos. Tive pena de nós. 

Daqueles que levam a vida demasiado a sério. Daqueles que se deixam levar por normas criadas por outros. 

Daqueles que limitam a sua própria felicidade e, até, a sua forma de se expressar. 

Que me interesse se o outro não gosta, ou não acha bem, se dançar me faz tão feliz?

Pensei em todos nós, humanos. Que aprisionamos vontades e desejos. Que nos deixamos tornar tão adultos que, vejam só, já não dançamos. 

E invejei os “ridículos”, os que dançam até cair a gargalhar. Os que pulam, pulam tão alto que quase voam. 

Invejei os que fecham os olhos, sentem os pés a sair do chão e o corpo a tornar-se cada vez mais leve. 

Invejei os que deixam que a alma dance. A sua própria dança, com os seus próprios movimentos. 

Invejei os que não deixam a inocência infantil morrer e quis muito dançar. Dançar até me faltarem as forças. Dançar, escrever, cantar, ler, correr, cozinhar, pintar, jogar... qualquer coisa que realmente me faça feliz. 

Quis despir-me de preconceitos e ser! Ser tudo aquilo que quero ser, sem me importar que os meus irmãos voltassem a entrar na sala, sem me importar com os olhos alheios, opiniões e dedos apontados. Existir sem me importar. Ser feliz sem me preocupar.

(Continua 👇)
[ ✨ Colocamos muitas vezes nas mãos do outro a [ ✨ Colocamos muitas vezes nas mãos do outro a tarefa de nos amar. Queremos que nos ame, que nos ame com alma, que nos garanta o seu amor. Que o prove. Que não haja qualquer dúvida. Em jeito de retribuição, por todo o amor que também lhe sentimos. 

Queremos receber no mesmo peso e medida, e se for um bocadinho mais, ainda melhor. 

A felicidade, para nós, os distraídos, vive nesse pedacinho da vida, nesse amor que o outro tem para nos dar. No sentir. E se, por desastre, ele nos falta, ficamos desolados, destruídos, magoados. 

Vamos aprendendo que não há amor que dure quando ele não vem de dentro, quando as suas bases não foram construídas de dentro para fora. Dentro de nós. 

Não há amor que seja suficiente quando colocamos aos ombros do outro a responsabilidade de nos fazer sentir amados. 

Não há amor que dure quando esse amor não começa na revolução de sermos quem queremos, livres. E de nos gostarmos assim, completos. 

Não há amor que dure quando os nossos olhos não conseguem enxergar beleza em nós. Naquilo que somos. Naquilo que fazemos. No que já construímos. 

Não há amor que dure quando em nós atribuímos todas as culpas das falhas que somos, dos erros que  cometemos. Não há amor quando não nos permitimos a compaixão. O nosso perdão. 

Não há amor que dure quando não somos capazes de nos amar. Para assim, e só depois, amar o outro. 

Aquele que se ama, ama o mundo. Ama desmesuradamente. Ama profundamente porque sabe que em si só há uma coisa: amor. 

Hoje, e tão hoje, começa de ti para o outro. Ama tudo o que és, tudo o que conseguiste, a tua gargalhada e as tuas lágrimas. 

Ama a tua força e a tua tontice. Ama as tuas fraquezas. Ama a tua capacidade de no meio de caos ser serenidade. Ama também quando és o caos. 

Começa por aí e saberes que a melhor fonte de amor está em ti. ♥️] 

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